Como trabalhar
a genética e a genialidade na educação no futuro?
Luís Moreira de Oliveira Filho
Os genes não determinam
o que nos tornaremos, mas, em vez disso, são agentes dentro de um processo
dinâmico. A expressão genética é regulada por forças externas. A
“hereditariedade” se revela de várias formas diferentes: nós herdamos genes
estáveis, mas também epigenes alteráveis; herdamos linguagens, ideias,
atitudes, mas também podemos modificá-las. Herdamos um ecossistema, mas também
podemos mudá-lo. Tudo nos molda e tudo pode ser moldado por nós. O que existe
de genial em todos nós é a nossa habilidade intrínseca de nos aprimorarmos e de
aprimorarmos o mundo em que vivemos.
Antagonismos, discrepâncias, incongruências.
Esse é o quadro com o qual nos deparamos quando analisamos e refletimos sobre a
influência da genética e do ambiente na inteligência, genialidade das crianças por um lado. Por outro, estão as
concepções de educação que estão postas e executadas através de propostas
pedagógicas nas escolas e que afasta muitas vezes, as crianças das escolas do
futuro. Será a genética determinante
entre o aluno mais capaz e menos capaz? Será o ambiente a alavanca necessária
ao desenvolvimento das crianças? Qual a relação entre genética e a genialidade
na educação do futuro? Como deve ser o ensino na educação no futuro? Como
professores e pais podem contribuir para o desenvolvimento das crianças? Como
deve ser o ensino? Que paradigmas seguir o processo de ensino e aprendizagem? O
que deveria ser a mediação pedagógica do professor para alçar as
potencialidades adormecidas de nossos alunos? Que autores embasam essa
discussão?
Essas e outras questões nortearão as leituras,
pesquisas e questionamentos sobre o tema proposto: trabalhar a genética e a
genialidade na educação no futuro. As
leituras de Vygotsky, Piaget, Gardner, Papert, Shenk, Leff são necessárias para
tecer reflexões e questionamentos da realidade a ser conhecida. Como metodologia escolher-se-á a pesquisa
bibliográfica por nos fornecer subsídios que contemplam a dimensão
interdisciplinar (Left, 2002, aponta que a interdisciplinaridade surge como uma
necessidade prática de articulação dos conhecimentos) do tema proposto, a
pesquisa, ato de aprender: o pensar, o fazer, refletir e questionar.
Importa observar que esse artigo não pretende fazer afirmações e nem tão
pouco defender a tese de que a genética é determinista (inata) no
desenvolvimento do ser humano e nem tão pouco afirmar que as questões
ambientais são condições sine qua non para o
desenvolvimento humano, principalmente das crianças. Ao contrário, parte-se do
pressuposto de que o homem é uma construção histórica que se inicia na
fecundação e que as interações entre a genética o ambiente são condições inerentes
na formação desse ser em aprendizado e transformação contínua. E que é preciso
fugir do reducionismo do conhecimento no campo da genética e da biologia
mecanicista da vida porque segundo Left (2002): a descoberta das bases genéticas dos sistemas vivos levou
à concebê-las com uma estrutura fundamental, determinante dos processos
evolutivos. E que segundo o autor:
Os fenômenos de desenvolvimento apareciam assim fundados na
reprodução de certas estruturas genéticas conformadas ao acaso, de seu
desenvolvimento ontogenético, de seu processo evolutivo, da produção ao acaso
de mutações genéticas e de sua seleção por assimilação ao meio ambiente. O
processo teleonômico assim constituído
afasta-se das concepções vitalistas e animistas, enquanto a emergência de
novidades biológicas não está predeterminada nas estruturas genéticas iniciais
ou um fim predestinado, “pois se o DNA é o suporte molecular da emergência, é
por si mesmo inerte e desprovido de propriedades teleonômicas. (LEFT, 2002, p.
40).
O objetivo desse artigo é analisar como
trabalhar a genética e a genialidade na educação do futuro, a partir de uma
pesquisa bibliográfica e como a mediação pedagógica pode conduzir alunos para o nível de desenvolvimento real na educação do futuro e por isso questão
dar-se-á uma maior referência às observações de Vygotsky sobre a qualidade da
mediação pedagógica que atinja as necessidades e potencialidades das crianças, as
inteligências múltiplas de Gardner e as observações de Shenk sobre o gênio que
há em cada um nós.
De acordo com Shenk (2011), os genes são
importantes na definição das características diferentes, mas em última análise,
cada ser humano é resultado de um sistema dinâmico, ou seja, cada um nós é
produto do desenvolvimento por meio do processo de interação gene-ambiente.
Sozinhas, as diferenças genéticas não determinam se somos mais inteligentes ou
não.
Já Gardner (1995), todas as inteligências
poderão e deverão ser desenvolvidas nas crianças, sendo que a herança biológica
não é o ponto determinante de um sujeito. Seu objetivo passa a ser a necessidade
de ter uma visão do pensamento humano mais amplo e mais abrangente daquela
aceita pelos estudos cognitivos de outras épocas. Para isso, o autor pesquisou
e fez estudos experimentais com crianças e com pacientes com dano cerebral.
Então, esse pesquisador propõe a teoria das
Inteligências Múltiplas e, a partir desse momento, a inteligência passa a ser
encarada como um espectro de competências, algo multifacetado, assim como uma
pedra bruta, tal qual ela poderá sofrer polimentos intensificando cada vez mais
o seu brilho.
Para Vygotsky
(1994), as características intrinsecamente humanas que resultam da interação
dialética do homem e o meio sócio-cultural, ou seja, não estão presentes no
homem, não são inatas e nem são meros resultados das pressões do meio externo. Nesse sentido,
o autor escreveu que o homem ao mesmo tempo que transforma o seu meio para
atender seus anseios e carências, transforma a si mesmo. Esse pesquisador entende
que o homem não só é o produto de seu contexto social, mas também um agente
ativo na criação deste contexto Exemplificando, o homem modifica o ambiente em
que vive através do seu comportamento – essa mesma modificação influenciará seu
comportamento futuro. Isso se traduz nas palavras de LEONTIEV, apud REGO (1994, p.49).
Cada indivíduo aprende a ser um
homem. O que a natureza lhe dá quando nasce não lhe basta para viver em
sociedade. É-lhe ainda preciso adquirir o que foi alcançado no decurso do desenvolvimento histórico da sociedade
humana (LEONTIEV, apud REGO, 1994, p.
49).
Nesse sentido, o psicólogo bielo-russo ressalta que os fatores biológicos
têm grande importância sobre os sociais, somente ao início de vida da criança.
Aos poucos ao interagir com seu grupo social, as pessoas de sua comunidade, com
outras crianças mais experiente e com objetos de seu contexto histórico pessoal
há mudanças de comportamento e por
conseguinte provoca o desenvolvimento de seu pensamento.
Nessa linha de pensamento, Left (2002) escreve que as descobertas da
biologia molecular e da genética moderna permitiram abstrair novos
entendimentos e combater o individualismo metodológico de que teria surgido da
noção de “adaptação do mais apto”. Dessa forma, nasceu a seleção natural como
efeito de populações ou indivíduos definidos por suas estruturas genéticas, e
não como a ação de indivíduos biológicos sobre o seu meio ambiente. Continua
Left, (2002, p. 40).
Nessa
epistemologia biologista, o sujeito apreende o objeto de conhecimento num
processo de assimilação-transformação de seu meio ambiente, de forma análoga à
função evolutiva dos organismos vivos em seu meio ecológico, desconhecendo os
efeitos no processo de desenvolvimento psicológico, da língua, das formações do
inconsciente, da ordem simbólica e ideológica e das relações sociais de produção,
como esferas de materialidade, cujos efeitos determinam o processo ontogenético
de todo ser humano.
Nessa linha de pensamento de Left, Shenk (2011) escreve que
os pais não transferem apenas DNA inalterados para os filhos, transferem também
instruções adicionais – conhecidas como material epigenético – que ajudam a
conduzir a maneira como os genes se expressarão. Isso significa que os pais
podem causar impacto no legado genético ou a formalização dos processos
epigenéticos segundo Left (2002).
Para GARDNER (1995, p. 31), (...) o ambiente em que as crianças vivem e
se desenvolvem, as primeiras experiências de vida são tão importantes que podem
determinar por completo a maneira com as pessoas se desenvolvem. . Alem disso,
para o autor, as crianças desenvolvem poderosas teorias e conceitos sobre como
o mundo funciona – o mundo físico, o mundo das pessoas desenvolvendo pelo menos
um nível de competência em relação aos sistemas simbólicos humanos básicos que
são a linguagem, número, música, etc. Nesse sentido, o autor evidencia:
O que nos surpreende nessas
aquisições é que elas não dependem de instrução explícita. As crianças
desenvolvem essas habilidades simbólicas e estes conceitos teóricos
principalmente por meio de suas interações espontâneas com o mundo no qual
vivem (GARDNER, 1995, p. 54).
Nessa linha de pensamento, Shenk (2011), escreve que os seres humanos são
diferentes uns dos outros não só por conta de nossas poucas diferenças, mas
principalmente porque cada instante de nossas vidas influencia de forma ativa a
própria expressão de nossas características genéticas. O autor afirma que cada
gene precisa ser ativado para que se inicie a construção proteica e isso não
significa que não tenha acontecido interação gene-ambiente, produzindo um
resultado improvisado e exclusivo a partir de elementos variados do ambiente. Para
Shenk (2011)
Genes, proteínas
e estímulos ambientais (entre eles comportamentos e emoções humanas) interagem
de forma constante uns com os outros, e esse processo interativo influencia a produção
de proteínas, que então coordenam as funções das células, que, por sua vez,
geram características individuais.
Vygotsky(1994), fala que o desenvolvimento do
sujeito humano se dá a partir de constantes interações com o meio social em que
vive, já que as formas psicológicas emergem da vida social e destaca a
relevante dimensão social que fornece instrumentos e símbolos para a
aprendizagem da criança (ver o processo da leitura e escrita). E o autor completa que o indivíduo criado num
ambiente que desconhece a escrita, de pessoas não letradas, não se
alfabetizará, da mesma forma que acontece com a aquisição da fala – a criança
só aprenderá a falar se viver em uma comunidade de falantes
Mesmo possuindo todo o aparato
físico da espécie que possibilita a seus membros o aprendizado da leitura e da
escrita, esse indivíduo nunca aprenderá a ler e a escrever se não participar de
situações e práticas sociais que
propiciem esse aprendizado. Esse é um exemplo claro de um processo de
desenvolvimento que não ocorre se não houver situações de aprendizado que o
provoquem (OLIVEIRA, 1997,p. 61).
Ademais, o aprendizado pressupõe uma natureza social específica e um
processo através do qual as crianças penetram na vida intelectual daqueles que
as cercam. (VYGOTSKY, l994, p.115). Já Shenk (2011) enfatiza que a inteligência
pode ser aprimorada e as crianças podem atingir o potencial intelectual. E que
as crianças se desenvolvem somente até onde o meio em que vive exige que elas
se desenvolvam, pensamento que vai encontro das ideias Left (2002) quando este
afirma que as características biológicas do ser humano impuseram, através de
toda a história, constrangimentos a seu comportamento social. E acrescenta: o
característico das sociedades humanas são os efeitos da língua, do inconsciente
e da história sobre essas bases genéticas que geram processos que não estão
“guiados” por suas condições filogenéticas. (LEFT, 2002, p. 41).
Vygotsky (1994)
salienta que o aprendizado da criança se inicia antes mesmo dela freqüentar a
escola, embora o aprendizado escolar introduza novos elementos no seu
desenvolvimento. Para isso, esse pesquisador traça uma distinção entre
aprendizado espontâneo e aprendizado científico. Dessa forma, o ser humano não
se encontra limitado à sua própria experiência pessoal, ou às suas próprias
reflexões, mas expande-se e aprofunda-se, em especial, graças à apropriação da
experiência social que é veiculada pela
linguagem. A criança amadurece sob
orientação de adultos ou crianças mais experientes, apropriando-se da cultura elaborada pela humanidade, ideia
que vai ao encontro do desenvolvimento dinâmico e do conceito de inteligência
como um conjunto de habilidades em desenvolvimento, conduzidos pela interação
entre genes e o ambiente (Shenk, 2011).
Sobre inteligência,
Gardner (1995, p. 14), afirma que é a capacidade de resolver problemas ou de
elaborar produtos que sejam valorizados em um ou mais ambientes culturais ou
comunitários.. Essa visão se contrapõe à visão tradicional de se conceber
inteligência definida como a capacidade de responder a testes de inteligência (SHENK
2011).
Com base nessas
questões, de acordo com Gardner (2011),
os educadores devem manter em mente os fatores extrapessoais que desempenham um
grande papel no desenvolvimento (ou impedimento)
do talento (inteligência) das crianças. O autor, também, aponta o papel dos
pais, educadores e escolas, enquanto centro de pesquisas, é fornecer
estratégias de atuação na mediação tanto no desenvolvimento biológico como na
construção do conhecimento.
Para isso, é
preciso ter mente que a criança é um sujeito histórico cheio de conflitos
internos, sociais e familiares que necessitam de compreensão nas suas
potencialidades e que segundo Gardner afirma que a criança é possuidor de
estruturas mentais para o desenvolvimento das Inteligências Múltiplas. Para o
autor, a escola atual não leva em conta as individualidades de cada criança no
processo de aprendizagem, pois a prática pedagógica é desenvolvida de modo
unilateral atingindo a todos da mesma forma, já que consideram que todas as
crianças aprendem da mesma forma. Diante dessas questões que levanta, ele
idealiza uma escola que:
(...)busque estimular o profundo entendimento dos alunos em
várias básicas. Que encoraja os alunos a
utilizarem este conhecimento para resolverem os problemas e completarem as
tarefas com as quais se deparam na comunidade mais ampla. Ao mesmo tempo, a
escola busca encorajar a mistura singular de inteligência de cada um de seus
alunos, avaliando regulamente seu desenvolvimento de uma maneira mais justa
para com a inteligência (GARDNER, 1995, p. 68).
O autor afirma
que a idade pré-escolar é essencial para trabalhar as Inteligências Múltiplas,
pois as crianças ainda não carregam o estigma do medo de errar, hábitos e
vícios do sistema escolar vigente, facilitando o trabalho de quem pretende
mediar o auxílio para o desenvolvimento das Inteligências Múltiplas nas
crianças. Shenk (2011) escreve que podem
existir vários fatores que impedem o desenvolvimento das crianças, entre eles: exposição
precoce inadequada à música; desenvolvimento precoce inexpressivo do cérebro;
atitudes desfavoráveis por parte da família e dos colegas; má educação musical;
prática insuficiente; falta de motivação; hábitos auditivos abaixo da média;
falta de um mentor adequado; e assim por diante. Esses são apenas alguns dos
motivos pelos quais cada criança de cinco anos possui um nível diferente de
“talento” musical aparente.
Gardner (1995) afirma que os primeiros
anos de vida as crianças possuem maiores possibilidades de desenvolverem suas capacidades intelectuais. Já para
Piaget, a criança nasce com sentido de pesquisar, de experimentar, de descobrir
e de desenvolver suas inteligências, cabendo aos professores e pais mediar esta busca
incessante que elas têm de
aprender novos conceitos. Shenk (2011)
observa que em vez de se perguntarem
se seus filhos estão entre os poucos “talentosos”,
os pais devem acreditar profundamente no potencial extraordinário deles. Sem essa fé por parte dos pais, é
muito improvável que conquistas significativas
venham a ocorrer.
Nesse sentido,
de acordo com Shenk (2011), não é a biologia que estabelece o patamar de
desenvolvimento de um individuo, mas fatores sociais, educacionais, econômicos;
que nenhum indivíduo está preso ao seu patamar original e que qualquer pessoa
pode se tornar mais inteligente se essa for uma exigência do meio. E cabe aos
pais entender esses processos e participar dele, ou seja, compreender um
processo de desenvolvimento que se iniciou bem antes do nascimento da criança.
E observar
como a biologia dos seus filhos interage com as diversas facetas do mundo
externo, entre as quais: o que os faz
rir ou chorar, o que prende a atenção deles e o que os deixa morrendo de tédio,
que gostos eles acham bons e quais acham ruins. E por isso, a função de pais e
professores é descobrir os processos que
irão gerar o melhor individuo possível, ou seja, os pais e escolas não podem se
constituir barreiras e obstáculos ao desenvolvimento das crianças como
constatou Piaget em suas pesquisas.
Voltando a Vygotsty e
Piaget, estes autores veem a necessidade de estudar e de conhecer a
origem dos processos mentais, isto é, como esses processos são
construídos ao longo da vida das crianças. Para Piaget, essa construção ocorre
a partir do mecanismo de equilibração e seus dois componentes: a assimilação,
no qual o sujeito atua sobre o meio, transformando-o, a fim de adequá-lo às
suas estruturas mentais; e a acomodação, no qual o indivíduo é modificado para
se ajustar às diferenças impostas pelo meio. Já
para Vygotsky, a construção se dá
pelo mecanismo da internalização e enfatiza que no desenvolvimento cultural da
criança, todas as funções ocorrem duas vezes: primeiro no nível social e depois
no nível individual; primeiro entre pessoas (interpsicológica) e depois no
interior da criança (intrapsicológica).
Da análise anterior,
entende-se porque os dois são chamados de interacionistas, posto que ambos
consideram essa construção como ocorrendo a partir da interação do sujeito com
o meio. E a interação gene-ambiente como
trata o interacionista Patrick Bateson citado por Shenk (2011) segue essa linha
de pensamento.
A diferença é que enquanto Piaget enfoca a
interação com o meio físico, Vygotsky dá total importância à interação com o
meio sócio-cultural. Suas congruências estão no entendimento que têm da criança
como sujeito construtor do próprio conhecimento, que constrói ou reconstrói
esse conhecimento, participando ativamente como arquiteto da aprendizagem.
Shenk (2011) faz os
seguintes questionamentos: quais dessas
crianças nascidas hoje se tornarão grandes pianistas, romancistas, botânicas ou
maratonistas? Quais delas passarão a vida imersas na mais completa
mediocridade? Outros questionamentos, nessa linha de pensamento, também são
necessários: quais os papeis de professores como ativadores de talentos,
competências e habilidades em nossas crianças? Qual é a escola do futuro?
Sobre esses questionamentos
Shenk (2011) responde: não sabemos, o que sabemos é que nosso cérebro e nosso
corpo são aparelhados para plasticidade;
são construídos para enfrentar desafios e se adaptar. Isso é válido desde os
primeiros instantes de vida. “O que os torna especiais não é o fato de nascerem
tão inteligentes, e sim sua capacidade de modificar suas mentes ao receberem
informações.”
Já PAPERT (1994, p. 54), a
instituição Escola, com seus planos diários de lições, currículo estabelecido,
testes padronizados e outras tantas parafernálias, tende constantemente a
reduzir a aprendizagem a uma série de atos técnicos e o professor, ao papel de
um técnico. E os sujeitos da aprendizagem estão em constante processo de
investigação, reflexão e cooperação, buscando novas formas de conhecimento. E o
mais importante é o processo exploratório ao qual é induzido o aluno, levando
este a desenvolver um processo de descobertas. Isso implica sempre uma educação
mediadora. Na educação do futuro a presença do professor como instigador e
mediador das potencialidades e inteligências
dos alunos é condição sine qua non para a escola do futuro.
Nesse sentido, o cerne da
visão sócio-interacionista no processo de ensino e aprendizagem é a qualidade
da intervenção do professor mediador que consiste em detectar se a criança está
fazendo o que sabe, o que pode, se está aquém de seu potencial e o quanto
poderia avançar. Já para Shenk (2011)
tudo começa com uma simples crença de que cada criança tem um potencial imenso
e que cabe a nós reunir todos os recursos ao nosso alcance para explorá-lo
porque os genes não determinam o que nos tornaremos, mas, em vez disso são
agentes dentro um processo dinâmico. Para SHENK (2011)
A
“hereditariedade” se revela de várias formas diferentes: nós herdamos genes
estáveis, mas também epigenes alteráveis; herdamos linguagens, ideias,
atitudes, mas também podemos modificá-las. Herdamos um ecossistema, mas também
podemos mudá-lo. Tudo nos molda e tudo pode ser moldado por nós. O que existe
de genial em todos nós é a nossa habilidade intrínseca de nos aprimorarmos e de
aprimorarmos o mundo em que vivemos.
Nessa perspectiva, acredita-se
que a criança tem a capacidade de ir além das estruturas e do nível de
desenvolvimento estabelecidos por Piaget, se o professor interferir, ajudar, em
vez de deixá-la trabalhar sozinha e só ficar acompanhando o que ela sabe. De
acordo com Shenk (2011), cada criança humana é uma entidade genética singular
concebida dentro do seu próprio ambiente, desenvolvendo imediatamente
interações e comportamentos exclusivos e intransferíveis. A inteligência não é
fixa; ela está esperando para ser desenvolvida e a criança pode atingir o nível
de desenvolvimento real, se o professor atuar dentro da zona de desenvolvimento
proximal.
Para PAPERT
(1994, p.22) o propósito da Máquina do Conhecimento se perderia se ela tivesse
como objetivo único, ser apenas um mecanismo para ensinar as crianças a lerem.
Para o autor ainda é necessário questionar não só o que a escola ensina, mas
também sobre como a escola ensina. Porquanto, a escola deveria mudar seus
paradigmas, ou seja, permitir uma educação em que as crianças assumam o seu
próprio desenvolvimento no sentido de se formar jovens pensadores nos quais
eles tenham que definir e redefinir seus papéis ao longo de suas vidas no mundo
cada vez mais tecnológico. Por isso que Papert
critica a ineficácia do sistema escolar em propiciar um ambiente de
aprendizagem que realmente não o considera como o sujeito histórico e
construtor do conhecimento e que a qualidade das intervenções do professor são
fundamentais no desenvolvimento das crianças.
Para Vygotsky o conceito de
conceito de zona de desenvolvimento proximal (ZDP) consiste na qualidade da
mediação pedagógica, posto que é preciso considerar que a criança tem
capacidade de resolver problemas, desempenhar tarefas, elaborar representações
mentais e construir conceitos com a ajuda de outras pessoas. A (ZDP) representa
a distância entre o que a criança já sabe e consegue efetivamente fazer ou
resolver por ele mesmo (nível de desenvolvimento real) e o que ela ainda não
sabe, mas pode vir a saber, com a mediação de outras pessoas (nível de
desenvolvimento potencial).
Nessa linha de pensamento, o
nível de conhecimento real e o nível de conhecimento potencial de cada criança
são variáveis e determinados, principalmente, pela mediação pedagógica Cada
criança, encontra-se num nível de desenvolvimento cognitivo diferenciado. O
nível de desenvolvimento real de uma criança define funções que já
amadureceram, ou seja, os produtos finais do desenvolvimento. Se uma criança
pode fazer tal e tal coisa, independentemente, isso significa que as funções
para tal e tal coisa já amadureceram. A zona de desenvolvimento proximal define
aquelas funções que ainda não amadureceram, mas que estão em processo de
maturação, funções que amadurecerão, mas que estão presentemente em estado
embrionário.
Essas funções poderiam ser
chamadas de “brotos” ou “flores” do desenvolvimento, ao invés de “frutos” do
desenvolvimento. Assim a zona de desenvolvimento proximal permite-nos delinear
o futuro imediato da criança e seu estado dinâmico de desenvolvimento,
propiciando o acesso não somente ao que já foi atingido através do
desenvolvimento, como também aquilo que está em processo de maturação
(VYGOTSKY, 1994, p. 113).
Nesse sentido, devido à
peculiar natureza social e cultural em que as crianças estão inseridas e a
forma como os saberes são processados, há necessidade de uma mediação externa
que guie as crianças na direção prevista nas intenções educativas, dentro da
ZDP. Isso é enfatizado por Vygotsky, quando ele fala que a ZDP pode
proporcionar novas maneiras da criança “menos competente”, enfrentar desafios e
atividades, graças à ajuda oferecida pelo seu professor ou por pessoas mais
experientes (seus colegas) ao longo da interação. Nessa perspectiva, o
psicólogo bielo-russo, coloca que a ZDP é um espaço sempre em processo de
mudança com a própria interação, que pressupõe um relacionamento constante e
contínuo entre o que os alunos sabem previamente e aquilo que têm de aprender,
segundo o planejamento do professor.
Shenk (2011) faz referências
à Gardner de forma explícita e Vigostsky de forma implícita, observando que pais e
amigos acabam desempenhando papeis complementares no desenvolvimento das
crianças. Pais como incentivadores para a disciplina, responsabilidade,
generosidade, respeito. E amigos como incentivadores na aprendizagem em grupo,
na descoberta do caminho para o desenvolvimento de estilos na interação com
pessoas da mesma idade. E completa: os mais jovens podem achar amigos
interessantes, mas voltam-se aos pais quando confrontados ao futuro. E não se
pode desconsiderar a influência da sabedoria popular acumulada por milhares de
anos na formação desses jovens.
Portanto, que considerações
podem-se abstrair a partir desses questionamentos e dessas reflexões à luz dos
autores referenciados? Que lições foram aprendidas? Que caminhos percorrer na
educação do futuro para que a genialidade se desenvolva nas crianças? É a
genética, condição sine qua non, para o desenvolvimento das potencialidades das
crianças? E as questões ambientais?
A primeira consideração
importante é que os genes não determinam o que nos tornaremos, mas que são
agentes dentro um processo dinâmico e muito complexo. Um processo que inicia
noves meses dentro do ventre materno quando o feto vai interligando questões
ambientais. A reflexão é que pais, professores e um projeto inovador de
educador podem potencializar o gênio que existe em cada ser. Que a genialidade
da vida está em ambientes ricos em estímulos e a capacidade de mediar um
processo de aprendizagem, onde as crianças continuem a desenvolver a pedagogia
das perguntas.
Que a emergência, segundo
Left(2002), dessas novas esferas de materialidade, a língua, a organização
social, o inconsciente fazem da história um processo que determina a estrutura
genética das populações biológicas, enquanto que seus efeitos sobre toda a
formação social condicionam a
transformação de seu meio ambiente,
assim como novas formas de relações sociais e de evolução biológica.
Concordando
com Shenk (2011), o que existe em genial em todos nós é a habilidade de nos
aprimorar e aprimorar o mundo em que vivemos. A realidade que está aí é uma
realidade criada por homens e mulheres e que precisa ser mudada. Tudo é criação
humana, mas falta originalidade e criatividade para se construir um mundo e uma
educação que potencializem a imaginação
criadora de nossas crianças e suas rebeldias naturais para o objeto a ser
descoberto.
A escola que
está aí, acéfa-la de referencial teórico que desenvolva a genialidades dos
alunos, é uma construção humana e que precisa ser repensada. A escola
necessária, é a escola que faça o aluno
sonhar alto e que não há limites para o aprendizado e para se trabalhar as
inteligências múltiplas. Que a genética das crianças é o amalgama que professores
e pais podem e devem trabalhar porque todas as crianças desenvolvem a
capacidade de aprender, umas com ritmos diferenciados das outras, umas com
curiosidades diferentes das outras e crianças com sonhos variados e
necessidades de aprender variadas.
Cada criança é
um ser histórico que inicia na gestação e segue por toda a vida e por isso nada
pode ser estudado sem considerar o
ambiente na vida do ser humano. “Não
há fator genético que possa ser estudado sem levarmos em conta o ambiente, e
não há fator ambiental que funcione independentemente do genoma”, cita Shenk
(2011).
E isso deve
ser considerado para se entender a origem do homem, que ao sair da África vai
mudando o seu fenótipo ao longo da jornada de milhares de anos por todos os
continentes (interação entre genes e ambientes), como por exemplo, a cor da
pele a depender dos raios ultravioletas (mais intenso nas zonas mais quentes e
menos intenso nas zonas mais frias, afetando, portanto, a produção de
melanina). E esse pensamento vai ao encontro do entendimento por Shenk (2011)
de que a expressão genética celular
pode ser alterada de forma estável em resposta a condições externas ao
organismo, de modo que ele possa se adaptar ao seu ambiente, gerando o
comportamento de um indivíduo.
E por isso, é imperativo considerar que
essas interações de ordem gene-ambiente podem gerar desenvolvimento específico
para cada criança e eis o erro da escola que tenta padronizar e engessar alunos
com seus processos de ensino e avaliação. Nesse sentido, o processo da ação
gene-ambiente pode ser um dos caminhos para se entender a complexidade humana,
com suas características únicas e necessidades de aprendizagem únicas, o que se
faz necessário pensar a educação do futuro centrada no desenvolvimento da
genialidade das crianças e referenciadas nos pesquisadores citados nesse
artigo: Vygotsky, Piaget, Papert, Gardner, Left, Shenk, autores que acreditam nas
potencialidades de aprendizagem das crianças e na emergência de uma educação
para o século XXI com a finalidade no desenvolvimento integral das crianças.
E por isso, é preciso entender ao máximo, o
processo influenciador dos genes mediado
pelo ambiente em que Shenk (2011) chama de desenvolvimento humano. Dessa forma,
segundo esse pensador é imperativo deixar de usar a palavra inato quando
lidamos com características tão complexas como inteligência e talento por um
lado. É claro que não pode subentender que cada pessoa tem exatamente as mesmas
vantagens ou limites biológicos, ou exatamente o mesmo potencial. O cerne é
entender que as crianças vão se tornando seres diferentes e com necessidades
diferentes. Como afirma o referido pesquisador, a criança desde a concepção
possui diferenças e que são resultadas da interação dinâmica das biologias
exclusivas de cada um como do ambiente único que os cerca. Como afirma Shenk
(2011), a semente mais insignificante em condições propícias se torna a mais
linda floresta, e, por outro lado, a semente mais promissora em condições
adversas não vinga.
Portanto, a
finalidade da educação do futuro é o
desafio da rapidez de aprender e a renovação constante do aprendido. A lógica
da pedagogia moderna deixa de ser o saber ensinar para o saber aprender. Na
escola do futuro, o homem moderno, da revolução da cibernética, não é o que
sabe, é o que está sabendo, isto é, o que está constantemente se renovando e
processando novos saberes. Vygotsky enfatiza o valor da aprendizagem por
descobertas, porque o conhecimento se torna mais significativo, deixando aberto
uma maior flexibilidade para o erro, reforçando as construções de novas estruturas
(Piaget) para a aprendizagem autômada. E a partir desse enfoque, aprender é
naturalmente um jogo de conquistas e surpresas reforçadas nas atividades
cognoscitivas.
A Pedagogia da
escola do futuro não está limitada a entendimentos mecanicistas das ciências,
mas, acima de tudo, é um importante meio integrador, transformador, instigador
e estimulador de mudanças. Se a
capacidade de um tecido muscular estriado de se adaptar a mudanças de atividade
ou condições de trabalho é extremamente alta não se pode negar a capacidade do cérebro de aprender e nem tão
pouco da escola reaprender como ensinar no século XXI.
Por fim o cerne da questão da educação do
futuro vai muito além de genes que potencializam a aprendizagem, talentos e
dons, o cerne está como as crianças estão aprendendo e como seus processos
biopscológicos interagem com o objeto da aprendizagem. E como professores, pais
e escola podem potencializar esses processos, o desenvolvimento dinâmico de
cada criança porque inteligência é um processo que continua por toda a vida e
não algo em si mesmo e que já nasce pronto e é inato. E que o professor nunca
foi tão importante como agora na educação do futuro,
Referências.
GARDNER, Howard. Inteligências Múltiplas. A
Teoria na Prática. Trad. de Maria Adriana Verissímo Veronese. Porto Alegre:
Artes Médicas, 1995.
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